The Callisto Protocol

21/06/2025

THE CALLISTO PROTOCOL: UM ECO SANGRENTO NA ESCURIDÃO DO ESPAÇO

por Joyce

Nem toda obra nasce para revolucionar. Algumas nascem para ecoar, para reinterpretar, para sangrar dentro de uma fórmula consagrada. The Callisto Protocol, lançado em 2022 pela Striking Distance Studios e dirigido por Glen Schofield (co-criador de Dead Space), é uma obra dessas. E se isso não é um problema, é porque o horror, quando bem executado, é atemporal.

No entanto, mesmo que The Callisto Protocol não esconda sua linhagem genética, ele tenta afirmar sua própria identidade. E é nesse esforço que o jogo revela tanto seus pontos altos quanto suas limitações.

O ENREDO: CONDENAÇÃO, CONTÁGIO E CONTROLE

Ambientado em 2320, o jogo nos coloca na pele de Jacob Lee, um transportador de carga interplanetário que se vê aprisionado injustamente em Black Iron, uma penitenciária de segurança máxima localizada na lua de Júpiter, Callisto.

Como é de se esperar, algo dá terrivelmente errado. Um surto biológico transforma prisioneiros e guardas em criaturas grotescas, e Jacob precisa sobreviver enquanto descobre os segredos por trás da infecção e da prisão em si. A trama evolui de um suspense carcerário para um horror sci-fi sobre bioengenharia, corrupção institucional e experimentos com o limite da humanidade.

Não é exatamente original, mas é eficaz. A narrativa funciona como um mosaico de temas clássicos do horror espacial: a solidão do universo, o corpo como campo de experimentação e a empresa como entidade monstruosa. Nada muito distante do que Dead Space, Alien, ou Event Horizon já nos mostraram. Mas ainda assim, impactante.

ATMOSFERA E DIREÇÃO DE ARTE: O HORROR NO DETALHE

Visualmente, The Callisto Protocol é um dos jogos mais impressionantes da atualidade. Os corredores de Black Iron são sujos, claustrofóbicos e iluminados com uma elegância cruel. A direção de arte evoca um senso de decadência industrial que contribui para o desconforto constante. O uso de sombras e silências é deliberado e eficiente. A todo momento, o jogo te lembra: você está sozinho, você está preso, e você é descartável.

Os inimigos, chamados de Biophage, são grotescos, com design anatômico visceral. O gore não é apenas um elemento estético: é uma linguagem. Ele comunica o horror corporal, a degradação e a desumanização.

MECÂNICAS E COMBATE: INTENSIDADE E LIMITES

O combate é onde o jogo busca inovar. Ao contrário de Dead Space, que foca no desmembramento com armas de longo alcance, The Callisto Protocol aposta em confrontos corpo a corpo. A esquiva e contra-ataque são mecânicas centrais, e isso dá uma sensação mais tátil e violenta aos encontros.

Porém, essa escolha não está isenta de problemas. O sistema é repetitivo, com pouca variedade de inimigos e padrões de ataque. A curva de dificuldade é mal calibrada e pode frustrar, principalmente em situações de múltiplos oponentes. A câmera é um obstáculo por si só.

Ainda assim, há um charme brutal na forma como cada luta é sentida. Cada morte é um castigo visual e sonoro. Cada sobrevivência, um alívio tenso.

TEMA: O CORPO COMO PRISÃO E O MEDO DA BIOPOLÍTICA

Sob a superfície, The Callisto Protocol é um jogo sobre o corpo. O corpo aprisionado, infectado, modificado, descartado. A prisão não é apenas um espaço físico, mas simbólico. É a representação de um sistema que desumaniza, que transforma seres humanos em cobaias, em vetores, em dados.

Essa é uma discussão profundamente contemporânea. A ideia de corpos gerenciados por instituições, de vidas reguladas por biotecnologia e lucro, aparece em obras como Blade Runner, BioShock e, claro, Dead Space. Mas aqui ela ganha uma roupagem mais crua, quase carcerária.

CONCLUSÃO: UM HERDEIRO IMPERFEITO, MAS NECESSÁRIO

The Callisto Protocol não é perfeito. Tem problemas mecânicos, narrativa previsível e momentos de frustração. Mas é uma obra visualmente impecável, atmosfericamente densa e filosoficamente rica para quem está disposto a enxergar além da carnificina.

Não é um substituto para Dead Space, mas um eco. Um reflexo distorcido em uma cela escura na lua de Júpiter. Um lembrete de que o horror não está apenas nos monstros, mas nos sistemas que os criam.

E talvez, só talvez, essa é a parte mais assustadora de todas.