
A República Dentro de Nós

Se Platão vivesse hoje, talvez não estivesse escrevendo diálogos — talvez estivesse twittando frases provocativas ou soltando vídeos de filosofia em um canal alternativo do YouTube, com fundo escuro e música de cítara. Mas mesmo assim, A República continua sendo um manifesto perturbador. Porque, na essência, ela não é um plano de governo. É um raio-x da alma humana.
Muita gente lê A República como uma utopia — uma cidade ideal, onde os governantes são sábios, os desejos são controlados e cada um ocupa seu lugar natural na ordem das coisas. Mas a genialidade de Platão está em algo mais profundo: ele usa a cidade como metáfora da alma. Ele não está apenas propondo um regime político — está propondo uma revolução interior.
A cidade justa, para Platão, é aquela em que cada parte cumpre sua função. O mesmo vale para a alma: razão, vontade e desejos devem estar em harmonia. Ou seja, antes de mudar o mundo, organize-se por dentro. O caos da pólis começa no tumulto da consciência.
Isso nos leva a uma questão que ainda hoje incomoda: quem deveria governar?

Para Platão, o filósofo — aquele que ama a verdade mais do que a glória, que deseja conhecer mais do que conquistar. Mas veja bem, ele não fala de "sabe-tudo". Fala de alguém que passou pelas dores do conhecimento, que viu a luz fora da caverna e voltou com a coragem de guiar. Não com arrogância, mas com responsabilidade.
Agora... dá pra pensar isso em pleno 2025? Uma era em que a dúvida é sinal de fraqueza e o grito vence o argumento?
A República não impõe modelos — ela lança perguntas. Como governar com justiça? Como viver bem? O que é o bem? Dá pra ter liberdade sem sabedoria? Dá pra ser justo num mundo injusto? Ela nos obriga a perceber que as escolhas políticas não são apenas sobre partidos ou leis — mas sobre quem somos quando ninguém está olhando.
Platão sabia: um povo sem filosofia se torna refém de seus impulsos. E um líder sem filosofia não governa — manipula.
Talvez, no fim das contas, a cidade ideal de Platão não esteja em algum ponto no mapa, mas no esforço diário de cada um de nós em tentar ser um pouco mais justo, mais lúcido, mais íntegro. A República é uma utopia? Talvez. Mas é uma utopia que nos aponta um espelho.
E às vezes, o que mais falta na política — e em nós — é justamente isso: coragem de se olhar no espelho.


Escrito por: Dart
Gosto de séries, filmes e quadrinhos

Revisado por: Joyce